sábado, 26 de dezembro de 2009
terça-feira, 22 de dezembro de 2009
Ano Novo
Meia noite. Fim
de um ano, início
de outro. Olho o céu:
nenhum indício.
Olho o céu:
o abismo vence o
olhar. O mesmo
espantoso silêncio
da Via-Láctea feito
um ectoplasma
sobre a minha cabeça:
nada ali indica
que um ano novo começa.
E não começa
nem no céu nem no chão
do planeta:
começa no coração.
Começa como a esperança
de vida melhor
que entre os astros
não se escuta
nem se vê
nem pode haver:
que isso é coisa de homem
esse bicho
estelar
que sonha
(e luta)
sexta-feira, 18 de dezembro de 2009
Relógio
As coisas vão
As coisas vêm
As coisas vão
As coisas
Vão e vêm
Não em vão
As horas
Vão e vêm
Não em vão
as coisas não têm paz.)
quinta-feira, 10 de dezembro de 2009
Anjo das tormentas
os pescadores fecham
a saída e a entrada
da aldeia
encurralam o anjo
mas ele invoca os ventos
os pescadores são muitos
mas não acuam o anjo agora
não por restarem poucos
mas por ninguém ousar
aproximar-se do mistério de sua fúria
o anjo era o terror de cada um
- um terror incógnito -
como uma voz sem corpo
deslocada
que chama
ao lado contrário do ser
quarta-feira, 9 de dezembro de 2009
domingo, 6 de dezembro de 2009
um presente
“Daria o melhor de mim para aproveitar as minhas capacidades como artista. Eu sinto-me responsável, verdadeiro e honesto para com minha profissão e estou consciente disso. Eu estou primeiro a lidar com a sociedade japonesa e a tentar ser cândido ao lidar com os nossos problemas. Espero que você entenda isso sobre mim quando vir o filme. Como um contador de histórias, não tenho segredos..”.
Vida longa, Katarino!
Um raio de sol através da chuva
Corvos
sábado, 5 de dezembro de 2009
capítulo para o "Evangelho"
De mim se há-de dizer que depois da morte de Jesus me arrependi do que chamavam os meus infames pecados de prostituta e me converti em penitente até ao fim da vida, e isso não é verdade. Subiram-me despida aos altares, coberta unicamente pela cabeleira que me desce até aos joelhos, com os seios murchos e a boca desdentada, e se é certo que os anos acabaram por ressequir a lisa tersura da minha pele, isso só sucedeu porque neste mundo nada pode prevalecer contra o tempo, não porque eu tivesse desprezado e ofendido o mesmo corpo que Jesus desejou e possuiu. Quem aquelas falsidades vier a dizer de mim nada sabe de amor. Deixei de ser prostituta no dia em que Jesus entrou na minha casa trazendo-me a ferida do seu pé para que eu a curasse, mas dessas obras humanas a que chamam pecados de luxúria não teria eu que me arrepender se foi como prostituta que o meu amado me conheceu e, tendo provado o meu corpo e sabido de que vivia, não me virou as costas. Quando diante de todos os discípulos Jesus me beijava uma e muitas vezes, eles perguntaram-lhe porque me queria mais a mim que a eles, e Jesus respondeu: “A que se deve que eu não vos queira tanto como a ela?” Eles não souberam que dizer porque nunca seriam capazes de amar Jesus com o mesmo absoluto amor com que eu o amava. Depois de Lázaro ter morrido, o desgosto e a tristeza de Jesus foram tais que, uma noite, debaixo do lençol que tapava a nossa nudez, eu lhe disse: “Não posso alcançar-te onde estás porque te fechaste atrás de uma porta que não é para forças humanas”, e ele disse, queixa e gemido de animal que se escondeu para sofrer: “Ainda que não possas entrar, não te afastes de mim, tem-me sempre estendida a tua mão mesmo quando não puderes ver-me, se não o fizeres esquecer-me-ei da vida, ou ela me esquecerá”. E quando, alguns dias passados, Jesus foi reunir-se com os discípulos, eu, que caminhava a seu lado, disse-lhe: “Olharei a tua sombra se não quiseres que te olhe a ti”, e ele respondeu: “Quero estar onde estiver a minha sombra se lá é que estiverem os teus olhos”. Amávamo-nos e dizíamos palavras como estas, não apenas por serem belas e verdadeiras, se é possível serem uma coisa e outra ao mesmo tempo, mas porque pressentíamos que o tempo das sombras estava a chegar e era preciso que começássemos a acostumar-nos, ainda juntos, à escuridão da ausência definitiva. Vi Jesus ressuscitado e no primeiro momento julguei que aquele homem era o cuidador do jardim onde o túmulo se encontrava, mas hoje sei que não o verei nunca dos altares onde me puseram, por mais altos que eles sejam, por mais perto do céu que alcancem, por mais adornados de flores e olorosos de perfumes. A morte não foi o que nos separou, separou-nos para todo o sempre a eternidade. Naquele tempo, abraçados um ao outro, unidas pelo espírito e pela carne as nossas bocas, nem Jesus era então o que dele se proclamava, nem eu era o que de mim se escarnecia. Jesus, comigo, não foi o Filho de Deus, e eu, com ele, não fui a prostituta Maria de Magdala, fomos unicamente aquele homem e esta mulher, ambos estremecidos de amor e a quem o mundo rodeava como um abutre babado de sangue. Disseram alguns que Jesus havia expulsado sete demónios das minha entranhas, mas também isso não é verdade. O que Jesus fez, sim, foi despertar os sete anjos que dentro da minha alma dormiam à espera que ele me viesse pedir socorro: “Ajuda-me”. Foram os anjos que lhe curaram o pé, eles foram os que me guiaram as mãos trementes e limparam o pus da ferida, foram os que me puseram nos lábios a pergunta sem a qual Jesus não poderia ajudar-me a mim: “Sabes quem eu sou, o que faço, de que vivo”, e ele respondeu: “Sei”, “Não tiveste que olhar e ficaste a saber tudo”, disse eu, e ele respondeu: “Não sei nada”, e eu insisti: “Que sou prostituta”, “Isso sei”, “Que me deito com homens por dinheiro”, “Sim”, “Então sabes tudo de mim” e ele, com voz tranquila, como a lisa superfície de um lago murmurando, disse: “Sei só isso”. Então, eu ainda ignorava que ele fosse o filho de Deus, nem sequer imaginava que Deus quisesse ter um filho, mas, nesse instante, com a luz deslumbrante do entendimento pelo espírito, percebi que somente um verdadeiro Filho do Homem poderia ter pronunciado aquelas três palavras simples: “Sei só isso”. Ficámos a olhar um para o outro, nem tínhamos dado por que os anjos se tinham retirado já, e a partir dessa hora, pela palavra e pelo silêncio, pela noite e pelo dia, pelo sol e pela lua, pela presença e pela ausência, comecei a dizer a Jesus quem eu era, e ainda me faltava muito para chegar ao fundo de mim mesma quando o mataram. Sou Maria de Magdala e amei. Não há mais nada para dizer.
Publicado em O Caderno de Saramago.
sexta-feira, 4 de dezembro de 2009
quarta-feira, 2 de dezembro de 2009
dos momentos
cândida, terna, doce…
é quando se sente leve
e voa como borboleta
beija feito beija-flor
sopra feito brisa mansa
e exala cheiro de jasmim!
tem momentos que é assim:
pesada que nem ferro que afunda...
é quando se sente fera
e rosna feito cadela doida
a boca cospe água salgada
mão que desata trevas
e exala cheiro de lama!
mulher: fascínio e desespero!
sábado, 28 de novembro de 2009
o que cabe no pensar
sexta-feira, 27 de novembro de 2009
quinta-feira, 19 de novembro de 2009
a poética da viagem
Não daria pra descrever, porque é muita coisa se amontoando no corpo e na cabeça de uma mulher de... Nossa!! Isso também faz parte dela, da crise. Uma idade que antes de chegar já anuncia as mudanças. Finjo que a omissão ajuda. Mas nada! Deixa-me aqui, essa pessoa que já passou dos 38. E é cheia de margens!
E por falar em viagem (estes parênteses são para ela – a viagem – depois volto pra crise), muito bom ver paisagens, gente e culturas tão diferentes! E mais uma vez “viajando” por esse mundo dos blogs, li algo que me chamou a atenção para o ato de viajar, numa dica de leitura de Teoria de viagem: uma poética da geografia, de Michel Onfray, filósofo francês, que traz questionamentos sobre o intuito humano para o ato de viajar, refletindo sobre as origens dos desejos que a motivam, porque nos sentimos mais nômadas ou sedentários, porque somos impelidos para o movimento constante, a deslocação, ou amamos o imobilismo e as raízes...
“Cada qual dispõe de uma mitologia antiga criada pelas leituras da infância, pelas recordações de família, pelos filmes, pelas fotografias, pelas imagens de um mapa-múndi de escola pendurado ao fundo da sala de aula num dia melancólico.”
Michel Onfray
Pois é... Eu cá, com meus botões, pensando sobre o que Onfray diz, revirando as memórias da infância e revivendo a minha geografia, vejo o quanto devem ter influenciado nesse meu desejo de viajar, e nas escolhas dos lugares onde vou. Curioso, estando em terras estrangeiras, foi me perceber tão desprendida de preconceitos, o que me permitiu mergulhar plenamente na paisagem, imbuída de um sentimento de pertencer a esta terra, a este universo, aos diversos elementos, num exercício de compreensão de outras realidades.
Aí me vem a frase do autor “O turista compara, o viajante separa.” E mais uma reflexão, embora o sentimento nacionalista se faça presente, compreender essas distintas realidades sem compará-las, talvez seja o mais saudável, e foi o que busquei fazer nessas minhas andanças por Portugal e Espanha.
E, realmente, o fato de conviver desde criança com os romeiros da Lapa, na sua peregrinação anual, além de todo o meu referencial literário e afetivo, vivido durante a infância, certamente contribuíram para a construção de um imaginário que, de alguma forma, foi determinante para fazer crescer em mim o apelo com relação aos lugares que me fascinam e me impelem a viajar.
Fato é que a viagem foi mesmo dos sonhos! Sonhos de menina e sonhos da mulher que hoje sou, de espírito aventureiro, já do nascedouro.
Santiago de Compostela - Es
Braga - Pt
Guimarães - Pt
quarto crescente
já nem lua é. A lua quer-se grande,
leitosa, apontável às crianças:
olha o homem da lua, os olhos, a
vassoura. Mas uma lua destas,
desfazendo-se em sombras, um ar
de quem passou o dia em claro
já nem lua é. Que não exija então
o impossível, que não se finja
a sério a pedir versos e algum olhar:
o poeta não usa telescópio,
nem se vai acordar uma criança
por gomos de luar
Ana Luísa Amaral, In "COISAS DE PARTIR" (1993)
quinta-feira, 1 de outubro de 2009
ver-rever-transver
terça-feira, 22 de setembro de 2009
Esopo
sexta-feira, 18 de setembro de 2009
CILELIJ
Os participantes do CILELIJ 2010 contarão com os módulos Acadêmico, que envolve conferências, mesas-redondas, comunicações e debates, no período diurno e é reservado aos participantes inscritos; e o Cultural, à noite, com exposições, espetáculos teatrais e lançamentos de livros, abertos ao grande público. O programa completo e os procedimentos para inscrição estão acessíveis no site www.cilelij.com.
quarta-feira, 2 de setembro de 2009
um lugar que já foi meu
Estive lá apenas por um dia, depois de três anos! Tão injusto dar tão pouco tempo pra memória! Uma crueldade... Logo ao chegar, o morro, de longe, me recebe, como se dando as boas-vindas. Percorro o mesmo trajeto da escola pra casa. Agora parece tão mais perto! Na boca o sabor do geladinho de manga, que só quem provou é que sabe. Viro a esquina e vejo o clube - os primeiros carnavais – fantasias, máscaras, blocos, bandas e marchinhas, que nem ouvimos mais.
E assim foi essa ida, rápida como os raios que eu via por lá, quando era criança ainda, e minha vó alertava: “Toma cuidado, menina! Fica atenta ao trovão! Depois dele sempre relampeja, e relâmpago é perigoso!”. Mas eu não tinha medo, não! Gostava mesmo era de tomar banho de chuva no quintal! Mas no dia que um raio derrubou o pé-de-limão, aí sim, senti um medinho só!
As visitas habituais seriam certas, como foram. Ir à gruta do Bom Jesus da Lapa. As cenas, quase que pitorescas, dos romeiros, envolvidos com suas orações, promessas e pagamento delas. Como o clima ainda é de romaria por lá, a cidade não se desfez desse cenário. Na porta da gruta, muitas barracas dos ambulantes. A memória viaja de novo, lembrando da infância, quando conheci as primeiras literaturas de cordel. Ficava encantada com aqueles homens enfeitados com acessórios de couro, chapéu, gibão e viola na mão, desenrolando com tranqüilidade versos engraçados, cheios de rima, com um forte conteúdo sertanejo nas histórias, no sotaque...
Por hora, tomo um café e penso: num tempo, aquele foi o meu lugar!
(...)
"Por isso gosto tanto de me contar
Por isso me dispo
Por isso me grito...”
Drummond
segunda-feira, 31 de agosto de 2009
Boas notícias
terça-feira, 25 de agosto de 2009
quarta-feira, 19 de agosto de 2009
anticristo
Bagdad Cafe
Esses dias dei pra arrumar as coisas todas, guarda-roupa, estante de livros, dvds, cds... bom rever coisas que nem lembrava mais que tinha! Então encontrei uns cds, trilhas sonoras de filmes: As Bicicletas de Belleville, O fabuloso destino de Amélie Poulain, Pulp Fiction, Natural born killers, Kill Bill, The Million Dollar Hotel, Jackie Brown e vários outros. Uma boa coleção! Mas um, em especial, me chamou a atenção: Bagdad Cafe. Trilha de um belo filme, sensível e delicado, do diretor Percy Adlon. Fala das relações humanas, do estranhamento em relação à novidade, de encontros e desencontros, descobertas e mudanças. A música tema se repete em várias versões - “Calling You”- indicada ao oscar de Melhor Canção Original; uma música melancólica e profunda que reflete perfeitamente o clima de solidão do deserto e das personagens de Bagdad Café. Mas é com a alegre canção “Brenda, Brenda” que o filme encontra seu ápice, tanto na trilha sonora, quanto no enredo, representando as transformações sofridas pelos personagens da trama. Realmente tocante! Daqueles que acabam e te deixam ainda na atmosfera...
quinta-feira, 13 de agosto de 2009
isca
Estou tão próxima das palavras, mas ainda assim me perco delas, às vezes...
Isca no mar de palavras, pesco algumas:
[...]
"Lutar com a palavra
é a luta mais vã.
No entanto,
lutamos mal rompe a manhã".
Carlos Drummond de Andrade
terça-feira, 11 de agosto de 2009
segunda-feira, 10 de agosto de 2009
nostalgia
Nessa época sempre sinto saudade da Lapa... Uma saudade que mistura monte de coisas! As memórias da infância, dos lugares, das pessoas, dos acontecimentos... É que no mês de agosto a Lapa fica em “festa” - a romaria! A cidade recebe "fiéis" de todo canto! Gente do norte, gente do sul, gente do meio, gente que não acaba mais! Gente que viaja longas horas, a maioria sobre a carroceria de um caminhão pau-de-arara, os romeiros tradicionais; e outra parte, os romeiros-turistas, que vai a procura de algo nostálgico, mais ligado a uma cultura turística do que ao desejo de peregrinação religiosa, ou seja, vêem a romaria, com seu misticismo, sua religiosidade, como uma curiosidade, enquanto os primeiros a têm como um culto.
Saí da Lapa ainda muito nova, portanto, o que me lembra esse período está muito ligado ao mítico, ao encantamento, próprios da infância. Embora hoje, já adulta, compreenda que as representações em torno da romaria sejam outras, ligadas a significações diferentes, devido aos sentidos que lhe foram sendo atribuídos, ao longo do tempo, pelos moradores, pelo clero e pelos próprios romeiros, sentidos esses que envolvem tanto o ideário peregrínico, quanto o aspecto turístico.
Fato é que a romaria possui um caráter festivo, lúdico e transgressivo da peregrinação, que incorpora o lazer, a diversão, o comércio, ao culto religioso. E isso movimenta Bom Jesus da Lapa há muitos e muitos anos! E tem tanto tempo que não vou lá nessa época... Razão da nostalgia.
quinta-feira, 30 de julho de 2009
a maior flor do mundo
"Também queria uma flor grande dessa! Mas ia molhar com meu regador que minha vó me deu!", disse ela quando terminei a história.
História de uma flor
By José Saramago
Aí pelos começos dos anos 70, quando eu ainda não passava de um escritor principiante, um editor de Lisboa teve a insólita ideia de me pedir que escrevesse um conto para crianças. Não estava eu nada certo de poder desobrigar-me dignamente da encomenda, por isso, além da história de uma flor que estava a morrer à míngua de uma gota de água, fui-me curando em saúde pondo o narrador a desculpar-se por não saber escrever histórias para a gente miúda, a quem, por outro lado, diplomaticamente, convidava a reescrever com as suas próprias palavras a história que eu lhes contava. O filho pequeno de uma amiga minha, a quem tive o desplante de oferecer o livrinho, confirmou sem piedade a minha suspeita: “Realmente”, disse à mãe, “ele não sabe escrever histórias para crianças”. Aguentei o golpe e tentei não pensar mais naquela frustrada tentativa de vir a reunir-me com os irmãos Grimm no paraíso dos contos infantis. Passou o tempo, escrevi outros livros que tiveram melhor sorte, e um dia recebo uma chamada telefónica do meu editor Zeferino Coelho a comunicar-me que estava a pensar em reeditar o meu conto para crianças. Disse-lhe que devia haver um engano, porque eu nunca tinha escrito nada para crianças. Quer dizer, havia esquecido totalmente o infausto acontecimento. Mas, há que dizê-lo, foi assim que começou a segunda vida de “A maior flor do mundo”, agora com a bênção das extraordinárias colagens que João Caetano fez para a nova edição e que contribuíram de maneira definitiva para o seu êxito. Milhares de novas histórias (milhares, sim, não exagero) foram escritas nas escolas primárias de Portugal, Espanha e meio mundo, milhares de versões em que milhares de crianças demonstraram a sua capacidade criadora, não só como pequenos narradores, também como incipientes ilustradores. Afinal, o filho da minha amiga não tivera razão, o conto, de transparente simplicidade, havia encontrado os seus leitores. Mas as coisas não ficaram por aqui. Há alguns anos, Juan Pablo Etcheverry e Chelo Loureiro, que vivem na Galiza e trabalham em cinema, procuraram-me com o objectivo de fazer da “Flor” uma animação em plasticina, para a qual Emilio Aragón já tinha composto uma bela música. Pareceu-me interessante a ideia, dei-lhes a autorização que pediam e, passado o tempo necessário, inútil dizer que depois de muitos sacrifícios e dificuldades, o filme foi estreado. Eu próprio apareço nele, de chapéu e bastante favorecido na idade. São quinze minutos da melhor animação, que o público tem aplaudido em salas e festivais de cinema, como foram, no passado recente, os casos de Japão e Alasca. Como foi igualmente o prémio que acaba de lhe ser atribuído no Festival de Cinema Ecológico de Tenerife, felizmente ressurgido de uma paragem forçada de alguns anos. Chelo veio a nossa casa, trouxe-nos o prémio, uma escultura representando uma planta que parece querer ascender até ao sol e que, muito provavelmente, irá continuar a sua existência na Casa dos Bicos, em Lisboa, para mostrar como neste mundo tudo está ligado a tudo, sonho, criação, obra. É o que nos vale, o trabalho.
Publicado em O Caderno de Saramago
terça-feira, 28 de julho de 2009
e por falar em cinema
Acontece essa semana, entre os dias 27 de julho a 01 de agosto, o V Seminário Internacional de Cinema e Audiovisual (SEMCINE). Como nos anos anteriores, o V SEMCINE exibirá filmes inéditos na Bahia e no Brasil, e promoverá discussões e reflexões sobre a criação, produção, circulação e o consumo do audiovisual. A mostra de longas metragem contará com películas inéditas dentre as quais: “Karamazov” filme Tcheco do diretor Petr Zelenka, premiado no Karlovy Vary Internacional Filme Festival; “La Buena Vida”, filme vencedor do prêmio Goya de melhor filme hispano-americano 2009, do chileno Andres Wood; “Intimidades de Shakespeare e Victor Hugo”, filme mexicano de Yulene Olaizola e “Pau Brasil”, de Fernando Belens, em pré estréia nacional e internacional.
Fonte:http://www.seminariodecinema.com.br/
segunda-feira, 27 de julho de 2009
.... mar com corpo, sala com mar, som
com sala, corpo com som. Sal, Sal,
e Sal. Boca de coral vermelho
numa língua de escamas cromáticas,
escalas de sargaço, notas desbotadas.
Naufrágio de cadeiras no resto
de ferros afundados. Ondas me arrastam
desta sala. Das correntezas do som,
a respiração deriva para a amplidão.
A dentada do pâncreas no rosto
de um tubarão. Onde as bocas
com a água dos corpos soletrada? Onde
as que querem com a náufraga se unir?
Nada escuto, neste mar agora amplo,
senão as ondas. Nas ondas do som, o silêncio de ondas. Só onde soa o silêncio de ondas anda o som, o som do silêncio. Entre silêncio e som, entre som e silêncio, a onda. Entre o sol do silêncio e o som do sol, entre o sono sonegado pelo sino do som, acorda o silêncio do sino solerte do sol. O solêncio. O sinêncio. (Jamais escutamos o silêncio sem o dizer. Jamais escutamos o silêncio sem o dizer).
António Cícero
quinta-feira, 23 de julho de 2009
conceitos que voam
“(...) e o céu, é um conceito que voa?”
ave
balão
avião
foguete
pensamento
borboleta
olhar
vento...
terça-feira, 21 de julho de 2009
linha da dança
De qualquer modo o corpo contém o dia.
De qualquer modo as cores e o Músculo.
De qualquer modo o coração.
De qualquer modo sempre no Fundo a Memória.
Mas de qualquer modo sem TEORIAS.
De qualquer modo com a teoria da poética que é não existir teoria e só existir poética.
De qualquer modo a ciência atrapalha um pouco, mas não totalmente.
De qualquer modo curiosidade.
De qualquer modo colecionar montanhas.
De qualquer modo acabar quando o ritmo exige que se continue
o ritmo exige coisas que não devemos aceitar obedecer ser escravos.
Gonçalo Tavares
domingo, 19 de julho de 2009
invenções
Você inventa grite
Eu invento ai!
Você inventa chore
Eu invento ui!
Você inventa o luxo
Eu invento o lixo
Você inventa o amor
Eu invento a solidão
Você inventa a lei
E eu invento a obediência
Você inventa Deus
E eu invento a fé
Você inventa o trabalho
E eu invento as mãos
Você inventa o peso
E eu invento as costas
Você inventa a outra vida
Eu invento a resignação
Você inventa o pecado
Eu fico aqui no inferno
Meu Deus, no inferno
Valha-me Deus, no inferno.
Ui! (Você inventa), de Tom Zé e Odair Cabeça de Poeta
sábado, 18 de julho de 2009
na letra "a" eu gosto de
quinta-feira, 16 de julho de 2009
esse corpo de água e outros elementos
Robert Musil, O homem sem qualidades
domingo, 12 de julho de 2009
blue hihway
embora o nosso inverno sofra uma crise de identidade freqüente (pensa que é verão), nesse tempo fico mais caseira, e nada melhor que um blues, pra combinar com a atmosfera, que também é pura cena, já que não tem frio, nem melancolia... chove em algum lugar, mas eu estou noutro lugar, que não aquele que chove! e tenho discos de blues! que alívio! só não tenho um inverno...
quinta-feira, 9 de julho de 2009
paixão pelos livros
Para gostar de ler
José Mindlin, 94, é formado em direito pela USP, já foi empresário, advogado, repórter e secretário estadual de cultura em São Paulo. No entanto, o que o tornou conhecido não foi o exercício de nenhuma dessas atividades, mas seu vício por livros, ao qual ele se refere como uma "loucura mansa". Em sua nova obra, "No Mundo dos Livros" (ed. Agir, 104 págs., R$ 30), Mindlin fala de seus autores favoritos, da revolução causada pelo surgimento da imprensa e do consequente aumento do acesso à leitura no século 15. Também explica como começou a formar sua biblioteca pessoal, aos 13 anos. Hoje, ela tem aproximadamente 38 mil volumes. Imortal (como são conhecidos os membros da Academia Brasileira de Letras), o bibliófilo diz que seu objetivo com o novo livro é "infectar as pessoas com o vírus da bibliofilia" . Ele não acredita que existam pessoas que não gostem de ler: "Certamente não foram devidamente estimuladas".
fonte: http://www1. folha.uol. com.br/fsp
terça-feira, 7 de julho de 2009
Açúcar e Arte
O Museu de Arte Moderna da Bahia recebe a exposição Saccharum BA, que aborda, por meio de diversas linguagens da arte, o tema do açúcar em suas múltiplas facetas. A cana-de-açúcar e a economia mundial, da época colonial ao bioálcool, alimento, mercadoria, combustível perpassam as propostas artísticas da exposição, que marca o encerramento do projeto multidisciplinar "A Rapadura e o Fusca: Cana, Cultura e Sociedade", do Goethe-Institut. A mostra reúne obras de artistas nacionais e estrangeiros, como Jonathan Meese, Simone Nieweg, Jürgen Stollhans e Janaína Tschäpe da Alemanha; José Rufino, Vauluizo Bezerra, Ieda Oliveira, Gaio Matos, Ayrson Heráclito, Maxim Malhado, Herbert Rolim, Márcio Fagundes, Caetano Dias e Baldomiro Costa do Brasil; Shelley Miller do Canadá, e Meschac Gaba do Benin, entre outros, além de peças dos acervos locais que têm relação com o tema. O circuito da mostra inclui três núcleos diferentes:
1) no MAM são apresentados trabalhos produzidos especificamente para a mostra, que dialogam com obras do acervo da Galeria Paulo Darzé e de arte moderna do próprio MAM;
2) na Galeria do ICBA, é apresentado um recorte sobre as cachaças baianas dirigida ao aspectos do design dos rótulos e da produção da bebida no interior da Bahia, com fotografias de Flavio Soledade;
3) no Museu Carlos Costa Pinto são focalizados alguns dos legados do engenho, acrescentando ao acervo próprio do local peças do Museu Wanderley Pinho.
A visitação estará aberta ao público até 30 de julho, com entrada gratuita.
segunda-feira, 6 de julho de 2009
psicodelia
Não deixo de me surpreender com a Bjork! Seus videoclipes são verdadeiras viagens, alucinantes!
sexta-feira, 3 de julho de 2009
cinema e café
tarde de um dia de férias. fui ver Palavra (En)cantada. belo documentário! a música como ponte para a poesia e a literatura. conversas com diversos artistas da nossa cultura: Arnaldo, Betânia, Chico, Adriana Calcanhoto, Lirinha, B-Negão, Tom Zé, Lenine... imagens raras! um deleite só!
depois aquela parada no Café do MAM, pro pôr-do-sol de cada dia. gente que vai chegando. um grupo, dois grupos, três grupos... falam e falam, blá, blá, olá, como vai? tudo bem? sorrisos, olhares, paqueras, conversa fiada e tambem pra boi dormir. mais tarde um som que vem das pickups de um Dj. grave, agudo, médio, alto baixo. silêncio é o que não há! aumenta a agitação. gestos articulam-se em meio às conversas. movimento dos corpos, respondendo à sedução da música. ali fico algum tempo! até que chega a hora de ir. nos vemos outro dia! vamos combinar algo pra depois... o ócio de um dia de férias!
A poesia é incomunicável.
Fique torto no seu canto.
Não ame.
Ouço dizer que há tiroteio
ao alcance do nosso corpo.
É a revolução? o amor?
Não diga nada.
Tudo é possível, só eu impossível.
O mar transborda de peixes.
Há homens que andam no mar
como se andassem na rua.
Não conte.
Suponha que um anjo de fogo
varresse a face da terra
e os homens sacrificados
pedissem perdão.
Não peça.
Carlos Drummond de Andrade
quinta-feira, 2 de julho de 2009
Museu da Língua Portuguesa - SP
curioso como não ficamos satisfeitos em apenas contemplar a leitura... desejamos a poesia como um souvenir. nada que uma câmera não resolva!
domingo, 7 de junho de 2009
condenados à música
"Onde estamos quando ouvimos música? A indicação do local permanece vaga; apenas é certo que nunca se pode estar completamente no mundo quando se está a ouvir música. Porque ouvir, no sentido musical, quer sempre dizer ou ir ao encontro do mundo ou fugir dele. Por isso, na aproximação a ontologia do ouvido surgem de novo as perguntas daquela antiga gnose que , na modernidade, apenas se pode manifestar anonimamente.O humano ser-no-mundo representa-se, segundo a compreensão gnóstica, como um ser indo ou com um ser vindo, nunca como um insistir e habitar,por mais que Heidegger numa tardia viragem criptocatólica tenha tentado de novo abordar o homem como um inquietante ser que habita. Representam-se, com razão, os anjos como músicos, apenas tocam, não ouvem nada. Se fossem ouvintes, seriam semelhantes a nós. Mas nós estamos condenados à música, como à saudade e à liberdade. Enquanto arte dos condenados, a música continuará a ser, segundo uma expressão de Thomas Mann, até nova ordem, um território demoníaco."
O Estranhamento do Mundo, Peter Sloterdijk.